- Os resultados do primeiro trimestre fizeram os mais otimistas sonharem com a possibilidade de que, no acumulado de 2022, a Vale superasse o lucro recorde alcançado em 2021
- As ações fecharam a quarta-feira (20) em R$ 67,39, uma queda de 11,98% somente no mês de julho e de 10,23% no acumulado do ano
- Para analistas, o cenário de curto prazo deve continuar difícil enquanto a China, o maior comprador de minério de ferro do mundo, adotar lockdowns para conter a covid-19
No final do primeiro trimestre de 2022, as empresas do setor de commodities viviam um momento bastante positivo. As ações da Vale (VALE3), por exemplo, tiveram um salto de 27,2% no período, saindo dos R$ 75,11 com que começaram o ano para encerrar o último pregão de março em R$ 95,60.
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Na época, o preço do minério de ferro havia disparado, com a tonelada sendo negociada perto dos US$ 150 em um cenário marcado pelo início da guerra entre Rússia e Ucrânia e gargalos na oferta causados pelo período de chuvas do início do ano.
Os resultados do primeiro trimestre fizeram os mais otimistas sonharem com a possibilidade de que os resultados da Vale no acumulado de 2022 superassem o lucro recorde de R$ 121,2 bilhões alcançado em 2021. Agora, porém, esse cenário parece muito menos provável.
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Se os primeiros três meses do ano foram marcados por uma alta de quase 30% nas ações da mineradora, os três meses seguintes amargaram quedas. A VALE3 caiu 19,92% entre abril e junho, encerrando o primeiro semestre cotada a R$ 76,56. Mas as baixas não pararam por aí: as ações fecharam a quarta-feira (20) em R$ 67,39, uma queda de 11,98% somente no mês de julho e de 10,23% no acumulado do ano. Nesta reportagem, explicamos por que o difícil cenário de curto prazo não muda a recomendação de compra para Vale.
Os motivos para a reversão daquele cenário bastante positivo para a mineradora vêm principalmente do outro lado do planeta. A China, o maior comprador de minério de ferro do mundo, voltou a adotar lockdowns no país para conter o aumento de novos casos de covid-19 – fechando suas grandes metrópoles, os portos e interrompendo as cadeias de distribuição.
“No primeiro trimestre, a Vale surfava um momento de restrição de oferta momentânea provocada pelo conflito na Ucrânia, ao mesmo tempo em que a situação da covid na China dava sinais de melhora. Porém, com as políticas mais fortes de covid zero e as restrições que parecem não surtir efeito para conter os avanços da doença no país alimentam as incertezas sobre quando de fato ocorrerá o fim do lockdown por lá”, explica Gabriel Tinem, analista do setor de mineração, siderurgia e telecomunicações da Genial Investimentos.
A política de lockdowns adotada pela China gera uma incerteza quanto ao ritmo da atividade econômica por lá e, portanto, à continuidade da demanda por minério de ferro. Somente nos últimos trinta dias, o preço da tonelada da commodity caiu de US$ 133,47 para US$ 104,76 – uma desvalorização de 21,5%.
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“As siderúrgicas chinesas vinham operando com uma taxa de utilização acima de 90% até meados de abril . Mas no final de maio e início de junho essa taxa caiu para 85%. Só isso já foi suficiente para ver um rebuliço no mercado”, afirma Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos.
Em um momento em que os mercados já estão estressados por causa do aumento das taxas de juros e inflação alta nos países desenvolvidos, as interrupções na economia chinesa agravam uma tendência de arrefecimento da atividade global.
Esse cenário reduziria, de modo geral, a demanda por commodities e impactaria negativamente empresas como a Vale.
E é essa impressão que também está ajudando a pressionar ainda mais as ações do setor de mineração e siderurgia. Para Renato Chanes, analista da Ágora Investimentos, existe atualmente uma dicotomia entre o sentimento do mercado e o fundamento dos investimentos nas empresas de commodities metálicas como a Vale. “Do ponto de vista do fundamento, continuamos vendo um equilíbrio entre oferta e demanda”, diz.
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Do ponto de vista do sentimento, porém, existe uma grande preocupação do mercado em relação à atividade econômica na China e os impactos que a continuidade da política de covid zero pode ter nos mercados. “Isso terá um impacto natural na atividade econômica. Só que o mercado parece perpetuar esse cenário”, pontua Chanes.
Com todas essas incertezas em jogo, a expectativa otimista de mais um ano recorde para a Vale ficou para trás. Mas isso não significa necessariamente que 2022 vai ser um ano ruim para a mineradora.
Para o analista da Ágora, 2021 foi bastante atípico, com demandas represadas por causa da pandemia e o preço do minério acima da média histórica. Por isso, não pode servir como base comparativa. “Talvez no início do ano as expectativas fossem mais positivas, o que fez o mercado ficar mais eufórico. Em 2022 a Vale deve entregar volumes semelhantes aos do ano passado, mas o preço do minério caiu, então o resultado tende a ser um pouco mais fraco”, explica.
A perspectiva após os números do 2º trimestre
A Vale divulgou na terça-feira (19) o relatório de produção e vendas do segundo trimestre do ano, que mostrou como o cenário conturbado está impactando a companhia.
A produção de minério de ferro no período foi de 74 milhões de toneladas, uma queda de 1,2% em comparação ao segundo trimestre de 2021 e 4% abaixo do consenso de mercado, que esperava uma produção perto de 77 milhões de toneladas.
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As vendas da commodity somaram 64 milhões de toneladas, 2,3% a menos que o mesmo período do ano passado.
“A produção abaixo do esperado foi explicada por restrições na cadeia de suprimentos como resultado das atividades de homogeneização de estoques em Ponta da Madeira para ajuste dos níveis de umidade, e pela venda das operações do Sistema Centro-Oeste”, explica, em relatório, Andre Vidal, head de óleo, gás e materiais básicos da XP.
Os números mais baixos fizeram a Vale rever o guidance de produção total de minério de ferro que havia estabelecido para 2022, reduzindo a meta de 320 a 335 milhões de toneladas para 310 a 320 milhões até o fim do ano. A revisão foi lida de forma negativa pelo mercado, o que fez as ações da mineradora caírem 2,16% na quarta-feira (20).
Para bater o guidance máximo, o segundo semestre da companhia vai ter que ser mais forte e superar, ao menos em parte, os mesmos problemas que fizeram os números da mineradora caírem no período. E o principal fator no caminho da Vale será novamente o cenário na China.
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Por lá, o governo vem anunciando medidas para estimular a economia e manter a demanda em alta mesmo no caso de novos lockdowns. “Várias medidas de estímulos já foram anunciadas, desde crédito para o consumidor até compras de estoques de aço para segurar o preço. Temos a visão de que a economia chinesa vai se recuperar e existe uma melhora para ser capturada”, aponta Renato Chanes, da Ágora.
Os estímulos são uma tentativa do Partido Comunista Chinês de aquecer a economia e entregar os 5,5% de crescimento no Produto Interno Bruto (PIB) prometidos. Na sexta-feira (15) o país divulgou dados oficiais mostrando que o crescimento econômico perdeu força no segundo trimestre, com alta de 0,4% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Para os analistas, a projeção de crescimento do PIB acima de 5% ficou mais difícil de ser alcançada, mas a perspectiva ainda não é de todo negativa para as mineradoras e siderúrgicas. “Se ao longo do segundo semestre tiver uma celeridade maior, com a China rumando para fazer 4% ou 4,5% de alta no ano, é possível revitalizar a indústria e cessar as maiores preocupações vigentes. O grande ponto é se vamos continuar vendo essas interrupções por conta da covid-19”, explica Ilan Arbetman, da Ativa.
Como a China é um grande player para a dinâmica das commodities, especialmente o minério, a continuidade dos lockdowns poderia prejudicar empresas do setor. Por outro lado, não estão descartadas uma melhora nesse cenário caso a transmissão da covid-19 no país seja controlada. “Existe a possibilidade de forte valorização acompanhada do minério de ferro caso a China dê indícios mais concretos da saída dos seus lockdowns, bem como de seus programas de estímulos”, destaca Gabriel Tinem, da Genial.
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