- Visto como positivo por trazer mais segurança ao ambiente de criptoativos como um todo, o Projeto de Lei 4401/2021 não trata de forma específica sobre tokenizadoras ou tokens
- Para alguns especialistas, a falta de menção provoca indefinições
- O projeto foi aprovado na Câmara em novembro e agora depende de sanção presidencial
Visto como positivo por trazer mais segurança ao ambiente de criptoativos como um todo, o Projeto de Lei 4401/2021 não trata de forma específica sobre tokenizadoras ou tokens. Para alguns especialistas, a falta de menção provoca indefinições. Tanto por não deixar claro se essas empresas podem ser incluídas entre as prestadoras de serviços digitais, sobre as quais o PL dispõe, quanto por abordar de forma genérica dos ativos financeiros que serão regulados.
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Por outro lado, há quem acredite que será possível acomodar essas questões no que já está previsto no texto. O projeto foi aprovado na Câmara em novembro e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro na quarta-feira (21).
Para Marcelo Castro, advogado da área de tecnologia do escritório Machado Meyer Advogados, a lei parece ter sido pensada para as corretoras de criptoativos, as chamadas exchanges. Mesmo assim, na opinião dele, não se pode desconsiderar que as tokenizadoras também são provedoras de serviços virtuais.
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“Pode ser que, eventualmente, as tokenizadoras caiam dentro desse conceito. Mas existe uma indefinição, elas não estão totalmente contempladas no projeto de lei. Vai ser necessário regulação específica para esse caso”, pondera o advogado. “Do jeito que está, o projeto de lei por si só não resolve. Vai ter de analisar caso a caso. O que é um problema, porque não tem, na lei, parâmetros precisos para distinguir a natureza jurídica (dos tokens).”
Segundo ele, no entanto, a aprovação do texto é um sinal positivo, pois traz a infraestrutura jurídica mínima necessária para a consolidação do mercado de criptoativos. Demanda, no entanto, normas infralegais, hierarquicamente inferiores à legislação, que provavelmente serão criadas pelo Banco Central (BC) e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em suas esferas de competência.
A entidade reguladora do setor de cripto também não foi definida no projeto de lei. A dúvida é se e como os criptoativos serão considerados meios de pagamento, na esfera do Banco Central, ou ativos mobiliários, sob as regras da CVM.
A CVM, em seu Parecer de Orientação 40, tipifica os tokens e os subdivide em categorias: tokens de meio de pagamento (caso das criptomoedas), tokens referenciados a ativos, sejam eles tangíveis ou não (abrange os security tokens, as stable coins e os NFTs) e os tokens de utilidade, usados para comprar ou acessar produtos e serviços (caso dos fan tokens, dos clubes de futebol). O parecer também explica que as definições não são estanques, ou seja, um criptoativo pode se enquadrar em mais de uma categoria.
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Se um título for entendido como valor mobiliário, deve passar e ser registrado pela CVM, explica Bruno de Freitas Gomes, superintendente de Securitização, Investimentos Estruturados e Agronegócio da CVM. Mas ele admite que a facilidade do processo de criação de tokens no ambiente digital pode levar o investidor a se deparar com ofertas em outros ambientes não-regulados. “As exchanges já estão fazendo muita coisa (ofertas de tokens) que o mercado de capitais não está, o que é um desafio”, afirmou Gomes em evento sobre regulação promovido pelo escritório Pinheiro Neto Advogados no último dia 15.
Outro desafio, contou Gomes, é saber tipificar um token, pois como ele mesmo comenta, o mundo da tokenização permite combinações. “Neste ano tivemos recorde de consultas pelo mercado sobre se token é ou não um valor mobiliário. Não é um assunto tão simples de ser analisado, é muito caso a caso”, disse Gomes. Ele citou como exemplo os fan tokens, dos clubes de futebol, que a depender do uso parecem utility, quanto a benefícios de fidelidade, e eventualmente têm cara de security, para comprar ingresso.
Brecha
A redação do projeto de lei cripto pode ter deixado de fora os vários tipos de tokens nesse primeiro momento, mas há uma brecha na lei que dá margem para uma eventual inclusão dos ativos na regulação, de acordo com o advogado Renato Opice Blum, chairman e sócio-fundador do Opice Blum, Bruno e Vainzof Advogados Associados. É o parágrafo único do artigo 3º, que diz que o órgão regulador vai poder estabelecer quais serão os ativos financeiros que serão regulados.
“Pode ser que, durante esse período de vacatio legis de 180 dias (prazo até a lei entrar em vigor), durante a elaboração das regras mais detalhadas, o próprio órgão já discipline isso”, pondera o advogado.
Mesmo que a oportunidade não seja aproveitada de prontidão, Opice Blum acredita que é uma questão de tempo até que haja uma regulação específica para os tokens. “Pode ser que essa regulação venha por meio de uma outra lei, caso não seja possível utilizar essa brecha. Mas, sem dúvidas, serão regulados.”
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Executivos que atuam diretamente com os tokens concordam com a possibilidade de haver algum tipo de acomodação no projeto de lei cripto. É o caso de Carlos Ratto, CEO da Vórtex QR, uma das principais empresas tokenizadoras do País. Ele não acredita na criação de uma norma específica para esse mercado – e, sim, na adaptação de algumas normas. “Não adianta a gente entrar com a estrutura se o mercado e o regulador não vierem juntos”, diz Ratto.
A Vórtex é uma das participantes do sandbox regulatório da CVM, ambiente que testa normas de regulação desde o ano passado. Até o momento, a empresa realizou quatro emissões, incluindo debêntures e cotas de Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), somando R$ 182 milhões tokenizados.
O CEO da MB Token, Reinado Rabelo, faz um paralelo com o surgimento dos bancos digitais, que foram acomodados pela legislação. “Os reguladores estão criando um ambiente em que observam a inovação sem atacar, mas com o objetivo de aprender”, afirma. Até o início de dezembro, a MB Token havia atingido a marca de R$ 200 milhões tokenizados. Tanto Ratto quanto Rabello têm no currículo passagens pela B3 e viram no mundo dos ativos digitais grande potencial de negócios.
PL e real digital terão impacto positivo
Ainda que o projeto de lei não trate dessas empresas, a regulação acabará afetando positivamente o mercado de tokenização, considera o advogado Pablo Cerdeira, sócio do Galdino & Coelho, Pimenta, Takemi, Ayoub Advogados. “Vai ser mais fácil separar as corretoras que estão completamente qualificadas das que não têm essa estrutura. Hoje, qualquer um pode abrir uma corretora de criptoativos, mesmo não tendo nada. Com o PL, a gente vai poder ter mais confiança naquelas corretoras que têm autorização do órgão competente, dando segurança para o mercado”, diz.
Ele lembra que as normas para atividades de emissão, intermediação e custódia de ativos digitais valem apenas para pessoas jurídicas. “Se uma pessoa física quiser fazer a tokenização do carro, por exemplo, pode, mas não está sujeito a essa lei”, exemplifica.
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O diretor jurídico da Foxbit, Victor Gomes, olha o mercado internacional para projetar o potencial de crescimento no Brasil. “Estima-se que o mercado de tokenização de ativos na Europa atinja 1,4 trilhão de euros em 2024. Haverá um reflexo no Brasil, porque além de uma adoção maior dos criptoativos, os reguladores têm se manifestado bastante sobre o tema”, afirma.
Depois da regulação, a implementação do real digital, a CBDC em estudo pelo Banco Central, deve impulsionar a tokenização no País. Isso porque a expectativa é de que o token do BC, com previsão de entrada no sistema financeiro entre o início do segundo semestre de 2023 e o fim da primeira metade de 2024, deve trazer mais segurança, exatamente por ser oficial, com lastro, credibilidade e escalabilidade.
“É o conjunto perfeito”, diz Krupinsk, da tokenizadora BlockBR. “O real digital é quem vai suprir uma grande questão para que o mercado possa evoluir e ter escalabilidade”, completa. Gomes, da CVM, concorda: “Todas essas ofertas vão conversar lá na frente com o real digital.”