- Lei dos Ativos Virtuais, aprovada em 2022, foi passo fundamental para o Brasil ser reconhecido como país sério e interessado no mundo cripto
- Banco Central Brasileiro tem se mostrado aberto ao diálogo com universo cripto ao investir no Real Digital e em um ecossistema colaborativo
- Enquanto os EUA enfrentam uma crise pós-FTX, o Brasil está sendo percebido como um país mais 'amigável' para a economia digital
O Brasil não é apenas geograficamente quente. O seu ecossistema cripto também está aquecido. Essa foi a conclusão clara da Consensus 2023, o evento mais relevante da economia digital, que ocorreu em Austin, Texas (EUA), no último mês. Se antes nos grandes eventos internacionais percebíamos uma curiosidade quase exótica dos estrangeiros pelo mundo cripto brasileiro, hoje o interesse é concreto e sério.
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Outra observação notável em Austin este ano foi a mudança na terminologia: o que antes era referido como mercado cripto Latam (América Latina), hoje é designado especificamente como mercado cripto brasileiro, um reflexo do ambiente progressista que construímos no País, singular até mesmo na região.
Mas o que está ocorrendo no Brasil para atrair esse interesse global?
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Na verdade, são duas narrativas paralelas em jogo. Por um lado, o mercado americano enfrenta um período desafiador, com indícios de um endurecimento regulatório. Por outro, vemos avanços significativos no Brasil, com progresso regulatório e uma colaboração efetiva entre players e reguladores. Em suma, o Brasil está sendo percebido como um país mais “amigável” para a economia digital.
Desde a falência da FTX, a corretora cripto que era (des)controlada por Sam Bankman-Fried, a SEC, equivalente americana à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) brasileira, vem adotando uma postura mais rigorosa em relação aos criptoativos nos Estados Unidos. Muitos deles passaram a ser classificados como “securities”, ou valores mobiliários, ou, no mínimo, há uma incerteza sobre sua classificação.
Além disso, desde o início do ano, diversos bancos americanos têm se tornado menos acessíveis para empresas cripto e dois dos bancos mais receptivos ao setor, Silvergate e Signature Bank, estão fora do jogo.
Neste cenário, poucas corretoras marcaram presença na Consensus deste ano, deixando espaço para infraestruturas cripto, que dominaram o evento. As corretoras, que antes eram preponderantes deram lugar à ideia de transformar a infraestrutura do mercado financeiro e de capitais.
Momento brasileiro
Embora a situação nos Estados Unidos seja complexa para o setor de criptomoedas, o Brasil segue um caminho distinto. Em 2022, o País deu um passo significativo com a aprovação e sanção presidencial da Lei nº 14.478, conhecida como Lei dos Ativos Virtuais. A matéria, que entrará em vigor dentro de pouco mais de um mês, ainda está em processo de finalização, aguardando o decreto do Poder Executivo para definir o regulador do mercado.
No entanto, a lei, fruto de uma parceria entre o Executivo, o Legislativo e a sociedade, representa um grande avanço. Apesar de desencorajar práticas ilegais, ela não inibe a inovação no setor. Em parte isso explica o grande interesse de companhias estrangeiras pelo setor cripto brasileiro.
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A ação proativa do Banco Central (BC) do Brasil ao desenvolver sua própria Moeda Digital de Banco Central (CBDC), o Real Digital, é mais um marco significativo. Em um esforço para integrar o Real Digital de maneira efetiva e segura ao ecossistema de criptomoedas, o BC incentivou a colaboração da comunidade cripto. Isso incluiu a solicitação de propostas de diferentes atores do mercado que pudessem ser incorporadas no Desafio LIFT – Laboratório de Inovações Financeiras e Tecnológicas, para iniciativas interessadas em criar produtos inovadores para o sistema financeiro nacional.
O Mercado Bitcoin, como um dos principais players do mercado brasileiro, submeteu uma proposta interessante que envolvia a negociação de ativos digitais utilizando o método de pagamento contra entrega (DvP). Notavelmente, esse método será posto à prova mais uma vez no piloto do Real Digital, programado para ocorrer no segundo semestre deste ano.
Considerando as vastas dimensões continentais do Brasil, a disseminação maciça de smartphones e a extensa rede de telefonia móvel – com mais de 234 milhões de linhas ativas, de acordo com dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) de 2022 – temos os elementos essenciais para um cenário extremamente competitivo no palco global, mesmo que não seja absolutamente perfeito.
Potência emergente
Com a iminente entrada em vigor da Lei Cripto e a adoção cada vez maior de criptomoedas em um país com população superior a 210 milhões de habitantes – dos quais estima-se que aproximadamente 10% já tiveram alguma interação com cripto –, o Brasil está se posicionando como uma potência emergente no panorama cripto global.
Portanto, não é surpresa alguma que o Brasil esteja recebendo reconhecimento em eventos internacionais, como o Consensus. O País deixou de ser apenas um ponto de interesse exótico para se transformar em um ator significativo, possuindo um mercado cripto próprio em constante crescimento e cada vez mais relevante no cenário global.
Cabe agora aos empreendedores e reguladores a tarefa de, no médio prazo, aprimorar ainda mais o ambiente cripto local, atraindo capital tanto financeiro quanto intelectual para o País. Sem dúvida, temos uma clara oportunidade ao nosso alcance.
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