O que este conteúdo fez por você?
- Ao E-Investidor, uma leitora conta que seu pai falecido deixou um imóvel que não tem um contrato formal de compra e venda
- Os chamados contratos de gaveta podem gerar dores de cabeças aos seus proprietários e até herdeiros
- Especialistas explicam quais são os seus riscos, como regularizar esse acordo e o que fazer quando vendedor ou comprador já estão falecidos
O pai de Erica Vieira comprou a casa em que a família vive há mais de 35 anos. Numa negociação que valeu a palavra do vendedor e a do comprador, ambos chegaram a um acordo sem que o meio jurídico adequado fosse acionado. Isso se entende como contrato de gaveta — e pode causar dores de cabeça aos seus proprietários e até para os herdeiros. No caso de Vieira, seu pai hoje é falecido e há dúvidas sobre qual o melhor caminho para regularizar o imóvel.
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Ao E-Investidor, ela escreveu buscando por essa informação e não forneceu mais detalhes do caso da sua família. Mesmo assim, advogados consultados explicaram como funcionam os acordos informais de compra e venda de imóveis e os riscos associados. Além disso, eles orientam quais são os passos e documentos necessários para regularizar um contrato de gaveta.
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Só que irregularidades em imóveis como no caso da família de Vieira não são isolados. Com dados referentes a 2019, o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional revelou que metade dos imóveis do País têm algum tipo de irregularidade: dos 60 milhões de propriedades no meio urbano, cerca de 30 milhões não tinham documentos legais, como a escritura.
A pasta não atualizou esse cenário desde então, mas as estatísticas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que novos processos envolvendo contratos de gaveta cresceram 42% de 2020 a 2023, passando de 1.352 para 1.929 novas ocorrências. Também no mesmo período, a quantidade de casos envolvendo o bloqueio de matrícula — que impede alterações na matrícula do imóvel até a solução de uma pendência judicial — avançaram 40%. Veja mais detalhes abaixo:
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O que é um contrato de gaveta e qual é o seu risco?
Aquele acordo informal, no qual só há algum tipo de registro ou reconhecimento de firma sobre a negociação, ou às vezes nem isso, é o que se chama de contrato de gaveta. “Pode ser considerado válido entre as partes, mas esse acordo não confere ao comprador a propriedade legal do imóvel“, explica Laísa Santos, advogada especializada em Direito de Família e Planejamento Sucessório.
Ela destaca que, no ordenamento jurídico, o Código Civil estabelece que a transferência da propriedade só ocorre com a inscrição do título no Cartório de Registro de Imóveis. Sem esse documento, há o risco de o proprietário inicial vender o imóvel novamente a outro comprador. Por isso, especialistas alertam que em disputas judiciais, se houver apenas o contrato de gaveta, corre-se o risco de o imóvel ainda ser considerado de propriedade do vendedor.
“A ausência de registro implica que o comprador não adquire a propriedade, o que o deixa vulnerável”, aponta Kevin de Sousa, advogado e especialista em Direito Imobiliário e membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ibradim).
Mas além do risco de perder a casa, o contrato de gaveta pode impossibilitar financiamentos. “Sem o registro da propriedade, o bem não pode ser utilizado como garantia para operações financeiras”, diz Souza. Por outro lado, ele alerta que a responsabilidade pelas dívidas e impostos incide sobre o nome da pessoa em que consta a matrícula do imóvel. “Com isso, as obrigações legais, em teoria, permanecem com o vendedor. Na prática, o comprador [quem mora no imóvel] costuma arcar com tais encargos”, diz, referindo-se a tributos como o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).
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Regularizar o contrato de gaveta ou pedir usucapião?
Na avaliação dos especialistas, a regularização de um contrato de gaveta é a solução mais segura e rápida. A advogada Laís Santos recomenda a formalização por meio da lavratura de escritura pública e registro do imóvel. “Essa medida elimina riscos de disputas, como a revenda a terceiros ou dificuldades na transmissão por herança“, explica.
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Vale dizer que esse caminho torna-se possível quando há consenso entre as partes. Se for essa a situação, a regularização demanda os seguintes passos:
- 1º – Lavratura da escritura pública: as partes devem comparecer ao Tabelionato de Notas para formalizar a transação;
- 2º – Registro no Cartório de Registro de Imóveis: após a escritura, o comprador deve registrar o imóvel no cartório competente.
Documentos necessários:
- Documento de identidade e CPF de ambas as partes;
- Certidão de casamento ou união estável, se aplicável;
- Certidão de matrícula atualizada do imóvel;
- Certidão negativa de débitos fiscais como o IPTU e ITBI;
- Comprovantes de quitação do imóvel (se houver financiamento).
Entretanto, quando não há acordo entre as partes, a usucapião pode se apresentar alternativa viável. Gustavo Costa, co-fundador e sócio da Herdei, frisa que nessa situação o caso pode ser submetido à avaliação judicial. “O inventário da posse do imóvel pode ser feito como o pedido de usucapião, judicial ou extrajudicial. Existem várias soluções, mas o melhor caminho sempre será registrar o contrato na matrícula do imóvel.”
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Como regularizar contrato de gaveta quando há falecidos envolvidos?
Acontece que o pai de Erica Vieira, leitora que escreveu para o E-Investidor, já faleceu. Quando situações do tipo acontecem, os herdeiros não podem incluir o imóvel no inventário automaticamente, pois permanece registrado em nome do vendedor.
Segundo Costa, da Herdei, a primeira opção para os herdeiros, se o vendedor estiver vivo, consiste em buscar a regularização consensual. “Os herdeiros devem inventariar a posse do imóvel e formalizar essa posse”, explica. Isso pode ser feito por meio da escritura pública e posterior registro no cartório, desde que se comprove que o pagamento foi integral.
Caso o vendedor tenha falecido ou se recuse a formalizar o contrato de gaveta, os herdeiros podem seguir pela adjudicação compulsória extrajudicial. A Lei nº 14.382/2022 abre a possibilidade de transferir a propriedade diretamente no cartório, desde que haja a comprovação de que o falecido comprador realmente quitou o valor integral do imóvel. Para isso, os advogados recomendam os seguintes passos:
- 1º – Início do procedimento no cartório: o comprador ou herdeiros devem solicitar a adjudicação no Cartório de Registro de Imóveis, apresentando a documentação necessária;
- 2º – Exame e conclusão: o cartório verifica os documentos e, se todos os requisitos forem atendidos, realiza a transferência da propriedade.
Documentos necessários:
- Contrato de gaveta ou promessa de compra e venda;
- Prova de quitação integral do valor do imóvel;
- Notificação ao vendedor, demonstrando a tentativa de formalização;
- Certidão de matrícula do imóvel.