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“Não podemos deixar a ação da Petrobras fora da carteira”, diz gestor do ASA

Entenda, na visão de Marcelo Nantes, por que a estatal tem atratividade; gestor fala também de Vale e mais papéis atraentes

“Não podemos deixar a ação da Petrobras fora da carteira”, diz gestor do ASA
Para o gestor de renda variável do ASA, as ações da Petrobras garantem proteção ao portfólio (Foto: ASA)
  • Enquanto o Ibovespa, principal índice da B3, acumula perdas superiores de 4% em 2024, as ações da Petrobras registram ganhos de dois dígitos
  • O histórico de bons resultados operacionais e a Lei das Estatais que dificulta as interferências do governo na gestão da companhia ajudam a tornar o papel atrativo
  • Marcelo Nantes é gestor de renda variável do ASA, instituição financeira com R$ 3 bilhões sob gestão, e possui 18 anos de experiência em mercado financeiro

As ações da Petrobras (PETR3; PETR4) enfrentaram ao longo do primeiro semestre do ano turbulências na Bolsa de Valores que testaram a credibilidade da estatal no mercado. A troca da gestão da companhia com a posse de Magda Chambriard para o cargo de CEO, que completa um mês nesta sexta-feira (19), e a retenção dos dividendos extraordinários em março adicionaram dúvidas aos investidores se a companhia merecia espaço no portfólio. Seis meses após esses eventos, as ações da petroleira conseguiram comprovar ao mercado que ainda são resilientes e merecem o voto de confiança.

Enquanto o Ibovespa, o principal índice da B3, apresenta perdas de 3,9% no acumulado do ano, as ações ordinárias e preferenciais da petroleira avançam 14,8% (PETR3) e 12,67% (PETR4), respectivamente. Ao olhar os múltiplos da companhia, como dividend yield (DY), retorno sobre patrimônio (ROE, na sigla em inglês) e preço sobre lucro (P/L), a companhia entrega o melhor risco-retorno de todas as ações listadas do Ibovespa, como mostramos nesta reportagem.

Dado a essas características, Marcelo Nantes, gestor de Renda Variável do ASA, instituição financeira com R$ 3 bilhões sob gestão, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), afirma que a estatal pode exercer um papel importante no portfólio do investidor. “Petrobras apresentou nos últimos anos excelentes dividendos. Então, não podemos deixar ações de Petrobras fora da carteira. Trata-se de uma empresa que garante proteção”, diz Nantes em entrevista ao E-Investidor.

A posição de Nantes aparece em meio a um receio do mercado com o futuro da companhia sob a gestão de Chambriard, indicada pelo governo para acelerar os projetos de investimentos. A ex-diretora geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP)  tomou posse como presidente da estatal no dia 19 de junho e herdou a complexa tarefa de conciliar os interesses do governo sem perder a credibilidade no mercado. Para o gestor do Asa, as recentes movimentações do Poder Executivo na gestão da companhia não afetam na tese de investimentos da Petrobras.

“Dificilmente o governo vai conseguir intervir como deseja na governança dessas empresas de capital misto porque a Lei das Estatais não permite”, avalia Nantes. Isso significa que a nova gestão da companhia não deve garantir surpresas indesejáveis para os investidores ao passo de comprometer substancialmente a rentabilidade da petroleira nos próximos trimestres. “O que deve acontecer é uma aceleração dos investimentos que já foram aprovados no Plano Estratégico“, reforça.

Mas as oportunidades na Bolsa de Valores não se limitam apenas nas ações da Petrobras. O gestor de renda variável do Asa enxerga um potencial de valorização dos papéis de companhias suscetíveis ao ambiente doméstico, como aqueles relacionados a shoppings, construção civil e saúde, mesmo com a Selic estacionada a 10,50% ao ano. Segundo ele, a visão sobre o potencial de valorização dessas empresas permanece desde o início do ano e a pretensão da gestora de investimentos é expandir o portfólio dos fundos de ações em direção a esses setores. “Estamos otimistas com os resultados das empresas expostas ao mercado doméstico a partir do terceiro trimestre”, diz Nantes.

Se as expectativas se concretizarem, a tendência é que o Ibovespa ganhe fôlego e recupere as perdas acumuladas nos primeiros seis meses de 2024. O especialista com quase 20 anos de experiência em mercado financeiro disse ainda que esse movimento depende também dos próximos passos da política monetária dos Estados Unidos. Confira a entrevista:

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E-Investidor – O Ibovespa encerrou o semestre com uma queda superior a 7%. O principal índice da B3 chegou no fundo do poço ou pode cair ainda mais em 2024?

Marcelo Nantes – Desde o fim do ano passado, observamos uma dependência muito grande entre o Ibovespa e os títulos soberanos de dez anos dos Estados Unidos. Quando esses títulos caem, o fluxo estrangeiro em direção ao Brasil aumenta. Se houver alguma alta lá fora, o movimento de resgate perdura. Então, estamos muito dependentes do que acontece no exterior. Na segunda metade de junho e na primeira semana de julho o governo mudou o tom do discurso sobre as contas públicas e vimos também uma melhora no exterior. Vejo que o mercado já incorporou boa parte das más notícias macroeconômicas que tínhamos. O impacto dos impostos nas empresas também já está incorporado na precificação da Bolsa.

O que pode fazer a Bolsa ganhar fôlego daqui para frente é a revisão de lucro das companhias e não vemos revisão de lucro para baixo. Estamos otimistas com os resultados das empresas expostas ao mercado doméstico a partir do terceiro trimestre. Já para os balanços do segundo trimestre, acreditamos que as companhias de commodities podem entregar bons resultados com a valorização do dólar. Por isso, avaliamos que o Ibovespa pode ter um desempenho mais positivo até o fim do ano.

Então, a estratégia do Asa anunciada no início do ano focada em dar prioridade a ações mais expostas ao ciclo doméstico permanece mesmo com a Selic estacionada?

Permanece. Temos parte do portfólio voltada para as ações de empresas suscetíveis ao ciclo doméstico, mas também temos posição em papéis que garantem proteção. O que eu quero dizer é o seguinte: a Petrobras, por exemplo, apresentou nos últimos anos excelentes dividendos. Então, não podemos deixar ações de Petro fora da carteira. Os papéis da companhia subiram 14% e minimizaram a queda do Ibovespa. Então, trata-se de uma companhia que garante proteção.

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Mas gostaríamos de estar mais expostos às ações mais suscetíveis ao mercado brasileiro. Estamos apenas esperando o mercado dar sinais de que haverá uma melhora. Acho que a temporada de balanço do segundo trimestre poderemos ver uma melhora nos números operacionais das empresas, com aumento da demanda e vendas mais fortes.

Há outros sinais que podem ser determinantes para a expansão do portfólio?

Estamos observando a expansão do mercado de crédito. Vemos os bancos um pouco mais agressivos na concessão de crédito. Olhamos também a inadimplência porque queremos entender como essa oferta pode impactar nas receitas das companhias. Como disse, o mercado de ações só consegue subir se as empresas crescerem.

Os fundos de ações vão conseguir se recuperar caso esses sinais de melhora se concretizem neste ano?

A maioria dos fundos de ações no Brasil tem um viés de se posicionar a empresas cíclicas domésticas. Ou seja, se houver uma sinalização do governo mais positiva no que diz respeito à disciplina fiscal, se houver uma transição suave na presidência do Banco Central (BC) e o banco central americano (Federal Reserve, o Fed) indicar uma maior propensão ao corte de juros nos EUA, os fundos de ações brasileiros deverão ter uma performance bastante positiva até o final do ano.

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Pensando em ações, é possível encontrar uma estratégia para garantir uma rentabilidade compatível ao IPCA+6%?

Sempre argumentamos que as melhores práticas de alocação de portfólio são os princípios da diversificação. É óbvio que os títulos IPCA+6% são bons, assim como os papéis IPCA+6,5%. Isso é excelente. Mas os investidores precisam diversificar o portfólio porque, no fim do ano passado, o Ibovespa subiu 15% em dois meses. Não sabemos quando teremos esse novo rali. Temos a expectativa que a Bolsa possa melhorar até o fim do ano. Agora, se vai ser em agosto, setembro ou em outubro, não sabemos.

Por isso, partimos do princípio que todo investidor brasileiro precisa ter uma parte do patrimônio aplicado em ações. Como o nosso benchmark (referência) é bater o Ibovespa, não olhamos para o IPCA+6%. Agora, se o índice superar essa rentabilidade, aí o nosso trabalho seria bater o IPCA+6%. Temos ações com um perfil menos volátil e com retornos bons, como os papéis de setor elétrico e de infraestrutura que possuem tendem a ter um comportamento mais próximo do IPCA. Parte do nosso portfólio está alocado nessas ações.

A Vale (VALE3) entrou no radar dos investidores com a renúncia de sua conselheira independente, Vera Marie Inskter. A decisão fomentou dúvidas sobre interferências políticas na companhia. Como o Asa avalia o atual momento da mineradora?

Temos as ações na carteira com exposição menor, mas temos. Trata-se mais de uma estratégia de risco para aproveitar uma possível alta do que gostar do papel em si. Tivemos no início do ano muito ruído em relação à sucessão do CEO (Eduardo Bartolomeu) com o governo tentando indicar um nome. O mercado vê essa tentativa como negativa, mas vejo como positivo porque o Poder Executivo não conseguiu o que queria. Ou seja, a governança da companhia funcionou. A situação do mercado imobiliário da China em um ritmo de desaceleração também pesa para a companhia. Então, vejo um papel para se ter muito cuidado visto que a demanda por minério de ferro pode não ser tão forte.

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E sobre a Petrobras, a ação pode continuar a ter esse papel defensivo na carteira do Asa nos próximos meses com a troca de gestão?

Quando o novo governo foi eleito, havia um discurso de que haveria uma intervenção muito maior nas estatais e poderia piorar a lucratividade das empresas. Mas vejo que dificilmente o governo vai conseguir intervir como deseja na governança dessas empresas de capital misto porque a Lei das Estatais não permite. Pode trocar CEOs, como vimos agora e também acompanhamos no governo anterior. O que deve acontecer é uma aceleração dos investimentos que já foram aprovados no Plano Estratégico.

Não estou dizendo que não há pressão política nem que haja vontade do governo em interferir, mas quero ressaltar que ficou mais difícil com a Lei das Estatais. Por isso, temos posição porque é uma empresa lucrativa e que possui peso no Ibovespa. De dezembro de 2022 até hoje, o Ibovespa subiu 15%. Já as ações da Petrobras avançaram 124%, enquanto os papéis do Banco do Brasil (BBAS3) avançaram 74%. Já as ações do Itaú (ITUB3; ITUB4) subiram 40%.

O governo reduziu o tom sobre o orçamento público e os ataques contra o Banco Central. Há possibilidade do mercado se deparar com novas crises ou decisões políticas que podem fazer preço na Bolsa neste ano?

Sim. O primeiro deles será a nomeação do novo presidente do Banco Central. O segundo vira do orçamento do ano que vem porque o mercado irá enxergar o quanto o governo vai estar disposto ou não a entregar um superávit ou um déficit fiscal em 2025. Isso vai ser bastante relevante.

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