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Por que o mercado errou feio no ano e como isso muda as projeções de 2024

No início do governo Lula, expectativa era de dólar e inflação em alta e PIB e Bolsa fracos, mas 2023 mostrou outro resultado

Por que o mercado errou feio no ano e como isso muda as projeções de 2024
(Foto: Envato Elements)
  • O mercado chega à última semana do ano em um cenário bem diferente daquele que foi desenhado no dia 2 de janeiro, data em que foi publicado o primeiro Boletim Focus de 2023
  • O primeiro Focus do ano previa um dólar a R$ 5,27, um Produto Interno Bruto (PIB) mais fraco, de 0,8%, além de inflação fora da meta, em 5,31%, e uma taxa de juros de 12,25%
  • Hoje, o dólar está a R$ 4,85, o PIB deve ficar na casa dos 3%, e a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) está em 4,04%

O mercado chega à última semana do ano em um cenário bem diferente daquele que foi desenhado no dia 2 de janeiro, data em que foi publicado o primeiro Boletim Focus de 2023.

A publicação do Banco Central (BC) consolida as perspectivas de agentes de mercado sobre dados econômicos importantes para o País e, na época, trazia algumas projeções nada animadoras para os 12 meses seguintes. O primeiro reporte previa um dólar a R$ 5,27, um Produto Interno Bruto (PIB) mais fraco, de 0,8%, além de inflação fora da meta, em 5,31%, e uma taxa de juros de 12,25%.

Paralelamente, a média das projeções para o Ibovespa em janeiro era de 126 mil pontos, como reportado pelo colunista do E-Investidor, Vitor Miziara.

Hoje, o dólar está a R$ 4,85, o PIB deve ficar na casa dos 3% e a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) está em 4,04%, dentro do limite da meta (entre 1,75% ao ano e 4,75% ao ano). Já a taxa básica de juros Selic termina 2023 em 11,75% ao ano, enquanto o Ibovespa rompeu o recorde histórico e está em 132,7 mil pontos.

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E não foram só as projeções para o Brasil que se provaram equivocadas. As apostas para o curso da política monetária dos Estados Unidos também ficaram aquém da realidade.

Para Leonardo Cappa, economista-chefe da TRAAD, nas análises sobre a situação econômica americana estão os principais erros dos profissionais do mercado em 2023. “Os estrategistas e gestores de fundos tinham um cenário mais negativo para os EUA e vários outros países. Mas chama a atenção que havia um consenso relativamente grande de recessão nos EUA já no final do primeiro semestre de 2023”, afirma Cappa.

“E como o mercado normalmente se antecipa de três a seis meses aos eventos, a expectativa era de que o início de 2023 seria muito negativo nas bolsas globais”, explica. Apesar de terem ocorrido vários sinais de estresse financeiro e a quebra de bancos, como Silicon Valley Bank (SVB), a recessão aguardada não veio. “Nem mesmo uma desaceleração muito forte. Pelo contrário, os últimos dados do terceiro trimestre mostram uma aceleração da economia americana.”, diz Cappa.

Agro, auxílios, guerra e Lula

Por trás dos equívocos do mercado, seja no Brasil ou nos EUA, estão fatores variados. Para Cappa, quando o assunto envolve o cenário doméstico, a forte contribuição do setor do agronegócio pode explicar as surpresas positivas. “A exportação de petróleo ganhou peso na nossa pauta e com isso também as exportações brasileiras bateram um recorde”, diz. “Não é a primeira vez, é a terceira vez seguida que a gente tem essa surpresa positiva de crescimento no PIB brasileiro.”

Para Christian Lupinacci, head de gestão da Nova Futura Asset, os incentivos governamentais feitos tanto no Brasil quanto nos EUA por conta da pandemia estão por trás deste cenário inesperadamente mais positivo, mesmo em um momento de juros altos no mundo. “Enquanto os bancos centrais apertavam de um lado, os poderes Executivos soltavam de outro”, afirma.

Já na visão de Jaqueline Kist, especialista em mercado de capitais e sócia da Matriz Capital, fora o forte desempenho do setor agrícola e a alta do petróleo na esteira da guerra entre Rússia e Ucrânia e entre Israel e o Hamas, conflitos difíceis de prever, a grande apreensão e pessimismo que tomou conta do mercado após a vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) justifica também as surpresas positivas.

“Se olharmos a queda da Bolsa logo após as eleições, teremos uma noção do quanto o mercado estava pessimista e as projeções também indicavam muito desse pessimismo”, diz Kist. De 31 de outubro de 2022, primeiro dia após eleição de Lula, até o final de dezembro do ano passado, a Bolsa caiu 5%.

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“A maior preocupação era com a questão fiscal, de termos um governo muito expansionista e que não se preocupasse com o limite de gastos. O mercado também estava acreditando pouco nas promessas de um arcabouço fiscal”, afirma a especialista. “Só o que a gente observou ao longo do ano foi uma evolução muito positiva do governo nas negociações com o Congresso e a aprovação do arcabouço fiscal.”

O consenso entre os especialistas é de que este foi um ano de muita volatilidade e baixa visibilidade, com eventos totalmente atípicos, como as guerras no Oriente Médio e a falência de bancos, sem grande desaceleração da economia americana.

Essa dificuldade ficou clara, principalmente, no desempenho dos fundos multimercados, produtos que costumam apostar na alta ou na baixa de ativos, como moedas, juros e ações. De acordo com levantamento feito pela TC Economatica, apenas 21% destas aplicações rendeu pelo menos o Certificado de Depósito Interbancário (CDI, parâmetro para desempenho de investimentos) em 2023 – performance que reflete, em parte, as teses equivocadas.

Paralelamente, os investidores que prepararam seus portfólios para um “apocalipse” na virada do ano e dolarizaram todo o patrimônio, seguindo as análises mais pessimistas, estão arcando com prejuízos. Isto porque a divisa cai mais de 8% frente ao real no ano.

Lições para 2024

Se em 2023, o mercado pode ter pesado a “mão” no pessimismo, para 2024 a conjuntura esperada já é bem mais positiva. Em especial, para o cenário doméstico de investimentos.

Os analistas apontam para uma inflação convergindo para a meta a continuidade dos cortes na Selic até um patamar próximo a 9% – o que deve trazer ainda mais alívio para as empresas e, consequentemente, para as ações listadas na B3, a Bolsa nacional. “O Ibovespa já subiu bastante, mas a nossa Bolsa não está tão cara quanto as de fora, que já estão acima da média histórica em termos de valuation (valor do ativo)”, afirma Cappa.

Entretanto, as oportunidades na renda fixa não cessaram. “Os juros ainda seguirão altos, logo o CDI ainda é um bom investimento para 2024”, diz o economista-chefe da TRAAD.

Kist, especialista em mercado de capitais e sócia da Matriz Capital, vê um novo ano mais propício para o investimento em ativos de risco, como ações ligadas ao setor de consumo no Brasil, fundos multimercados com bons gestores de câmbio e juros, fundos de renda variável global, para capturar os benefícios das quedas de juros no exterior, além de criptomoedas, com o avanço da regulação em relação a novos ETFs (fundos negociados em bolsa) criptos.

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Já Lupinacci, head de gestão da Nova Futura Asset, se posiciona de uma maneira mais cautelosa, sem “comprar” análises muito positivas ou negativas, como ocorreu ao longo deste ano. “Todo mundo entrou esse ano falando que teríamos um hard landing (recessão severa fruto de um aperto monetário), agora o mercado todo acha que a gente vai ter um soft landing (aperto monetário sem provocar recessão ou com impacto suave sobre a economia). Talvez algo no meio termo, não dá para ter certeza ainda”, afirma.

Riscos

Alexandre Lohmann, economista-chefe da Constância Investimentos, por sua vez, ressalta os riscos que ainda seguem no radar para o ano que vem e que devem ser levados em consideração. “O aspecto fiscal pode gerar uma volatilidade no início do ano, já que o governo talvez poderá alterar a meta de déficit primário zero. Além disso, há também um risco climático – agora, estamos com o El Niño (fenômeno que altera a distribuição da temperatura na Terra –, que gera uma alta bem sustentada dos preços dos alimentos”, afirma Lohmann.

“Mas, de maneira global, estamos caminhando para a meta e esses choques tendem a ser de natureza temporária.”

Talvez a principal lição que o investidor possa tirar dos equívocos de 2023 seja evitar mudanças bruscas de portfólio em função de conjunturas potencialmente momentâneas. Montar uma estratégia de longo prazo, com diversificação, pode configurar a melhor forma para conseguir ganhos consistentes e estar preparado para diversos cenários.

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