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Comportamento

Por que aprender um instrumento é como tocar um negócio

Jay-Z, Gwen Stefani e integrantes do Kiss são exemplos de sucesso nos dois meios

Por que aprender um instrumento é como tocar um negócio
Quincy Jones no 47º Montreux Jazz Festival, em 2013 (Foto: Jean-Christophe Bott/EFE)
  • Quando percebe-se que aprender a tocar um instrumento musical não é muito diferente de comandar um negócio, começa a fazer mais sentido saber que Paul Allen, um dos fundadores da Microsoft, era também um gênio da guitarra
  • Persistência, disciplina e criatividade são apenas alguns pontos de convergência entre as empreitadas. Isso também explica porque tantos músicos profissionais também são empreendedores de sucesso
  • Alguns exemplos de sucesso nos dois meios são Jay-Z, Gwen Stefani e os integrantes do Kiss

(Murilo Basso, Especial para o E-Investidor) – No início de 2018, o astro da música Quincy Jones concedeu uma entrevista para a revista Vulture. Na conversa, Jones fez uma série de revelações, como a de que teria tido um encontro romântico com a “primeira-filha” norte-americana, Ivanka Trump, e de que considera Caetano Veloso e Gilberto Gil verdadeiros “reis” da música. Jones também contou que Paul Allen, um dos fundadores da Microsoft, que morreria em outubro daquele ano, “tocava guitarra e cantava como Hendrix”, para a surpresa do repórter.

À primeira vista, a ideia de um nerd da informática como Allen tocar guitarra como uma das maiores lendas do rock’n’roll soa estranha. Quando percebe-se, porém, que aprender a tocar um instrumento musical não é muito diferente de comandar um negócio, começa a fazer mais sentido saber que um dos fundadores de uma das empresas mais revolucionárias da história era também um gênio da guitarra.

Persistência, disciplina e criatividade são apenas alguns pontos de convergência entre as empreitadas. Isso explica por que tantos músicos profissionais também são empreendedores de sucesso e estão à frente de negócios, como Jay-Z, Gwen Stefani e os integrantes do Kiss, só para citar alguns.

Não ter medo de arriscar (e de falhar)

Todos já ouvimos de um amigo ou colega que essa pessoa sempre teve vontade de aprender a tocar determinado instrumento musical, mas que sequer tentou por medo de a atividade ser muito difícil e, consequentemente, as falhas serem inevitáveis. O mesmo vale para muitas pessoas que já cogitaram empreender, mas acabaram desistindo por medo dos riscos.

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Administrador de empresas e professor da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), José Sarkis Arakelian, diz que a primeira coisa que um empreendedor deve, efetivamente, entender é que não existe a possibilidade de investimento sem risco. Quando a decisão é por dedicar-se a um negócio próprio, troca-se o certo pelo incerto.

“Não há possibilidade de não existir risco porque você nunca controla a demanda: a demanda não é sua, ela depende de alguém que não é você. Você projeta um negócio baseado no passado, observando concorrentes, outras empresas que estão ou estiveram no mercado e que comportamento o consumidor teve. A partir disso, constrói o presente e mira no futuro, mas o futuro é incerto por definição. O máximo que podemos afirmar é que num negócio pequeno o risco é mínimo, mas dizer que não existe risco é inocência e insensatez”, afirma.

No mesmo sentido, o professor Felipe Morais Menezes, da Escola de Gestão e Negócios da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), fala que mergulhar na busca pela criação de algo novo e diferente já é, por si só, um risco, seja de investimento de dinheiro ou mesmo de tempo, um dos bens mais preciosos da atualidade. Isso não significa, porém, que não existam formas de minimizar esse risco. Em um negócio, pesquisa, planejamento são fundamentais. É imprescindível também que o empresário conheça o segmento no qual o empreendimento está inserido. Já ao se aventurar pelos caminhos de um instrumento musical é a prática que leva à perfeição.

“Falhar vai fazer parte do processo, e está tudo bem! Falhar faz parte da aprendizagem. Para reduzir os riscos, é sempre importante entender qual é o problema de fato e qual é a solução que está sendo proposta para resolvê-lo. E mais: não podemos pensar no problema apenas do ponto de vista de quem está empreendendo; é necessário entender o problema também sob a perspectiva de quem é afetado por ele”, opina o docente.

Persistência, disciplina e foco

Ninguém tem a intenção de se tornar o novo Jimi Hendrix quando decide começar a tocar guitarra, mas o objetivo é, ao menos, conseguir ler as partituras de forma correta e reunir os amigos tirar um som nos fins de semana. Mesmo com esse foco mais singelo, o caminho não é fácil e é preciso que o aspirante a músico seja persistente e tenha muito foco e disciplina.

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Afinal, se todos os violonistas tivessem desistido na primeira tentativa frustrada de fazer uma pestana, praticamente não haveria quem tocasse violão no mundo. Nos negócios o cenário não é diferente. Ao optar por investir em uma empresa, o empreendedor precisa ter em mente que é natural que o sucesso não será imediato e que não se deve desistir no primeiro obstáculo encontrado.

“Precisamos ter humildade para reconhecer que, por mais preparados que estejamos, há muitas pessoas preparadas também no mesmo cenário. Dificuldade e percalços vão existir. É preciso compreender essas dificuldades e estar preparado para agir contra isso. Nosso papel é nos planejarmos o melhor possível e seguir oferecendo o melhor para os clientes”, pontua Arakelian.

Por mais ansioso que o empreendedor fique para que o negócio dê retorno, assim como o pianista iniciante não vê a hora de tocar uma peça de Beethoven, ele tem precisa compreender que tudo leva o seu tempo.

“A questão do tempo que um negócio leva para engrenar depende do ramo de atividade e do segmento. Por exemplo, atividades de prestação de serviços costumam dar retorno mais rápido. O que é diferente, por exemplo, das startups que pretendem lançar um produto que ainda não existe no mercado e que vai demorar um pouco mais para se popularizar. Por isso, sempre reforço que o empreendedor não pode desistir, deve ser resiliente, ter coragem e avaliar diariamente o que está dando certo e o que não está, desde a abordagem inicial até o serviço em si. Isso vai ajudar a pensar nos próximos passos e naquilo que pode ser melhorado”, orienta Moacir Niehues, diretor executivo do Sicredi Vale do Piquiri Abcd PR/SP.

Constante exercício de criatividade

Exercitar a criatividade é fundamental tanto para quem se dedica a aprender um instrumento musical quanto para aqueles que desejam empreender. Muitas pessoas, porém, sentem-se desestimuladas para ambas atividades por não se considerarem naturalmente criativas, sem perceber que se trata de um atributo que pode, muito bem, ser exercitado.

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“A forma mais relevante de exercitar a criatividade é ter curiosidade, ser aquela pessoa que procura, lê sobre o assunto, pergunta para as pessoas e está sempre atento. Isso vai gerando mais conexões na mente, mais entendimento sobre o negócio em si e, consequentemente, gera mais criatividade para executar o que for necessário. Exercitar a curiosidade é, sim, uma grande ginástica”, sugere Niehues.

Felipe Morais Menezes afirma que todas as pessoas possuem a capacidade de serem criativas. O que acontece, na maioria dos casos, é que não somos estimulados a exercitá-la por boa parte da vida. “Ao mesmo tempo, a criatividade não é algo natural, pois nosso cérebro nos ‘boicota’ nesse sentido. É mais fácil para nós conduzirmos as coisas da forma com que já estamos acostumados a fazer. Um bom exercício é olhar as nossas ações sob diversas perspectivas, o que se chama de flexibilidade cognitiva. Podemos nos perguntar ‘e se?’ a cada decisão que tomamos. Outro exercício é conversar sobre determinados assuntos com pessoas que não são do nosso círculo de convívio e que tenham opiniões diferentes da nossa, num processo de escuta ativa”, orienta o pesquisador da Unisinos.

É preciso ressaltar, ainda, que nos negócios, nem sempre a criatividade está atrelada à criação de algo completamente inédito, sendo possível se inspirar em algo já existente e agregar mais valor à prestação de serviço.

Paixão e inspiração

Ainda que persistência, foco e disciplina sejam cruciais para que um músico tenha sucesso em sua empreitada, a paixão pelo ofício acaba sendo o que mais pesa. Num negócio, pesquisa e planejamento são fundamentais, mas a paixão pelo empreendimento conta muito. Niehues reforça que é muito importante que o empreendedor se sinta motivado e conectado com os propósitos do negócio, mas, ao mesmo tempo, é preciso encontrar um equilíbrio entre paixão e razão.

“Sem dúvida, é importante trabalhar com aquilo que gosta e que o faz sentir bem. Na contramão disso, porém, temos também que ter equilíbrio. Muitas vezes, é possível estar tão apaixonado que não se percebe os erros que estão sendo cometidos. Conheço empreendedores que ficam tão fascinados com a ideia e acreditam tanto naquilo que acabam ficando cegos para as possíveis implicações do projeto. Não se pode deixar que o excesso de paixão deixe o empreendedor ‘cego’ e ‘surdo’. Como dica, sugiro sempre que o empresário seja um bom ouvinte e tenha humildade para aceitar ajuda e ideias”, orienta, afinal, muitas vezes a diferença entre atingir ou não um objetivo está atrelada à paixão e à vontade que se tem de chegar aonde se almeja.

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