Se o investidor depende da renda dos dividendos para viver, provavelmente escolheria a primeira ação, já que na segunda há o risco de interrupção de proventos em algum momento. Este é o conceito de previsibilidade, também chamado de consistência. “É a capacidade de a empresa pagar ano após ano dividendos elevados, polpudos e crescentes”, comenta Daniel Nigri, analista e fundador da Dica de Hoje Research.
A situação exemplificada acima existe de verdade. A Taesa (TAEE11) se encaixa perfeitamente no primeiro exemplo, de pagamentos regulares, enquanto o segundo exemplo poderia ser representado pela Petrobras (PETR3; PETR4), que passou de 2015 a 2018 sem pagar dividendos e nos últimos dois anos se beneficiou da redução do endividamento e da alta do preço do barril de petróleo – um momento cíclico que pode não ocorrer no futuro – para encher os bolsos do acionista.
Mas quais seriam as empresas da Bolsa que pelo seu histórico teriam capacidade de pagar mais de 6% de dividend yield em 2024? Um levantamento exclusivo de Daniel Nigri, da Dica de Hoje Research, para o E-Investidor apresenta as companhias que nos últimos três anos entregaram mais de 6% em dividendos aos seus investidores todo ano e têm potencial de continuar remunerando seus acionistas neste patamar em 2024.
Foram consideradas companhias com volume mínimo de negociação de R$ 1 milhão ao longo dos últimos 21 dias. O estudo revelou 15 empresas e 17 ações – Cemig (CMIG3; CMIG4) e Petrobras entraram com dois códigos, por conta dos papéis ordinários (ON) e preferenciais (PN).
Empresa |
Dividend Yield 2021 |
Dividend yield 2022 |
Dividend yield 2023 |
Dividend yield últimos 12 meses |
Dividend yield médio 3 anos |
Banco ABC (ABCB4) |
6,4% |
8,19% |
6,26% |
8,12% |
7,24% |
Taesa (TAEE11) |
13,51% |
13,35% |
8,41% |
10,01% |
11,32% |
Wiz (WIZC3) |
7,57% |
7,39% |
6,35% |
6,46% |
6,94% |
Brasilagro (AGRO3) |
10,48% |
18,25% |
10,72% |
11,55% |
12,75% |
Banrisul (BRSR6) |
7,12% |
9,13% |
9,46% |
9,53% |
8,81% |
Bradespar (BRAP4) |
18,91% |
13,09% |
10,17% |
9,73% |
12,97% |
CSN (CSNA3) |
6,03% |
10,33% |
17,5% |
15,58% |
12,36% |
Cemig (CMIG4) |
10,69% |
13,5% |
11,59% |
11,57% |
11,84% |
Gerdau (GGBR3) |
15,14% |
16,15% |
6,86% |
6,62% |
11,19% |
Lavvi (LAVV3) |
7,4% |
11,63% |
13,84% |
13,93% |
11,7% |
Irani (RANI3) |
6,57% |
9,27% |
10,6% |
10,46% |
9,22% |
Cemig (CMIG3) |
9,47% |
9,55% |
7,99% |
7,99% |
8,75% |
CPFL Energia (CPFE3) |
11,37% |
12,08% |
8,69% |
8,98% |
10,28% |
Metalúrgica Gerdau (GOAU4) |
20,6% |
10,98% |
12,26% |
11,64% |
13,87% |
Petrobras (PETR3) |
19,59% |
54,52% |
25,85% |
26,75% |
31,68% |
Petrobras (PETR4) |
19,94% |
58,84% |
29,58% |
30,36% |
34,68% |
Vale (VALE3) |
16,74% |
9,73% |
6,84% |
6,57% |
9,97% |
Fonte: levantamento Daniel Nigri, Dica de Hoje Research. Dados até 09/01/24. Dividend yield = retorno em dividendos
O dividend yield mínimo de 6% costuma ser muito procurado por investidores que buscam renda passiva. E é utilizado até mesmo por grandes personagens da Bolsa como Luiz Barsi Filho, maior investidor pessoa física da B3. O número foi disseminado por Décio Bazin, autor do livro “Faça fortuna com ações antes que seja tarde” ainda na década de 1990. O rendimento se justificava na remuneração que os títulos de renda fixa ofereciam na época.
3 oportunidades para não perder de vista
A exímia pagadora de dividendos
Entre as 15 empresas da lista, Nigri cita oportunidades para o investidor que busca receber dividendos de forma constante e perene. A primeira delas é a transmissora Taesa (TAEE11), que segundo Nigri já provou ser uma exímia pagadora de proventos há pelo menos 12 anos. “A empresa possui uma agenda de pagamentos muito consolidada e divulga proventos nos meses de maio, agosto, novembro e dezembro”, destaca.
Embora em 2023 os dividendos da companhia tenham recuado por conta de um cenário desafiador provocado pela deflação do Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), a Taesa conseguiu entregar um retorno em dividendos de 8,41% para os acionistas que adquiriram o papel no começo do ano passado.
“A tendência é que o IGP-M volte a subir, porque não existe deflação para sempre, e as RAPs (Receita Anual Permitida) de mais de 60% do seu portfólio aumentem a partir do segundo semestre de 2024”, afirma Nigri. Em relação aos 40% restantes do quadro da companhia, o analista acredita que também haverá incremento nas receitas por estas serem indexadas ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor – Amplo (IPCA), que deve ficar em torno de 4%.
Nigri destaca que ainda existem alguns projetos da Taesa para entrar em operação no decorrer de 2024, o que também deve beneficiar os resultados da elétrica. Mesmo com os investimentos que a companhia terá que fazer nos projetos, Nigri projeta que ela distribua pelo menos R$ 3 por ação em 2024, equivalente a um dividend yield de 8%.
Entre os pontos de atenção, Nigri cita que a companhia estaria esticada, negociando a um múltiplo Preço/Lucro (P/L) de 11,39 vezes, acima da sua média histórica de 9 vezes.
ABCB4: uma empresa de crescidendos
Outra companhia considerada oportunidade é o Banco ABC (ABCB4), que empresta dinheiro apenas para empresas. Segundo Nigri, o banco inicialmente tinha um foco de atender companhias corporate e high corporate, com faturamento superior a R$ 100 milhões. Contudo, nos últimos anos o ABC começou a investir no segmento middle – empresas com faturamento anual entre R$ 30 e R$ 300 milhões. “Isso fez os resultados crescerem e os dividendos aumentaram”, pontua.
Nos últimos trimestres, a alta da inadimplência reduziu o apetite do banco para potencializar o crescimento da carteira de crédito, mas na visão de Nigri, com um custo de captação de recursos menor por conta da queda da taxa básica de juros da economia (Selic), o banco deve recuperar o seu apetite de crescimento e alcançar lucros cada vez maiores.
“Acreditamos que o banco terá uma menor provisão para devedores duvidosos em 2024. Desta forma, vai focar novamente em crescer a sua carteira middle, que possui um spread mais elevado, assim que o índice de inadimplência começar a cair”, avalia o analista da Dica de Hoje Research.
Ele também aponta que o banco ABC possui uma política de dividendos muito clara, distribuindo proventos geralmente em fevereiro e agosto – os anúncios são feitos na maioria das vezes nos últimos dias úteis de dezembro e junho. “Há mais de uma década funciona dessa forma”, diz.
Os dividendos também são crescentes ao longo do tempo. Em junho de 2012, a companhia distribuiu R$ 44,5 milhões em proventos, enquanto em junho de 2023 o montante pago foi de R$ 184,8 milhões. Nigri projeta que o banco pague dividendos de R$ 1,60 por ação neste ano, equivalente a um dividend yield de 7%. Ele destaca que mesmo com o forte crescimento, o banco ainda negocia na média histórica de P/L de 6,4 vezes.
GOAU4: uma holding para dividendos
A terceira empresa na lista de oportunidades é a Metalúrgica Gerdau (GOAU4), holding que possui 33,5% da Gerdau (GGBR4). Para Nigri, a ação da empresa está muito barata, negociando a 3,8 vezes o seu lucro. O mercado está precificando um cenário complexo no curto prazo para Gerdau devido ao menor crescimento global e à grande oferta de aço chinês no mundo.
“Se comparamos a holding com concorrentes, como CSN (CSNA3) e Usiminas (USIM5), a Metalúrgica Gerdau é mais resiliente em manter as margens e permanecer no lucro, mesmo em situações adversas”, observa Nigri.
O analista projeta um dividend yield de 8% para 2024, abaixo do registrado em 2023, de 12,26%. “A queda nos proventos ocorre pela redução do payout (parcela do lucro destinada a proventos) para 35% do lucro líquido. A baixa no lucro também impacta”, pontua.
As ações que não devem ser fiéis ao histórico
Na lista de empresas, há também companhias que têm um cenário complexo pela frente e que não são recomendadas por Nigri para quem busca dividendos no longo prazo. Uma delas é a Petrobras, que deve entregar um dividend yield de entre 12% e 14% neste ano, abaixo do registrado em 2023, de 29,58%. A companhia vem de uma trajetória decrescente de proventos.
Segundo Nigri, o preço do barril do petróleo não deve seguir tão elevado este ano quanto em 2023. Além disso, ele observa que as ações já valorizaram mais de 80% no ano passado, deixando pouco espaço para o ganho de capital. “No preço atual, a companhia não compensa os riscos envolvidos”, afirma.
Outra empresa que oferece riscos à estratégia de dividendos é a CSN (CSNA3), diz Nigri. A companhia está em prejuízo nos últimos 12 meses e caso não recupere a lucratividade pode até não remunerar os acionistas neste ano.
Ainda entre as que devem ver os dividendos recuando está a corretora de seguros Wiz (WIZC3). Embora tenha superado o patamar de 6% nos últimos três anos e tenha uma média de dividend yield de 6,94%, a companhia aprovou em 2023 uma redução do seu payout de 50% para 25% do lucro. No passado a Wiz já chegou a distribuir 100% do lucro em proventos.
Com esse corte pela metade, os dividendos da Wiz também devem cair. Nigri espera algo em torno de 3,17% para 2024. “Dificilmente o lucro da Wiz irá dobrar para compensar a queda do payout. É uma empresa que o investidor deve olhar com cuidado porque pode reduzir os proventos”, diz.